Bem é verdade que a vida civilizada pode proporcionar-nos condições materiais necessárias ao pensar metafísico ou mesmo puramente estético. Entretanto, alguns incômodos são inevitáveis, a não ser que se aprecie viver como um hippie imundo e sem direção, o que, obviamente, não é o nosso caso. Assim o são as regras sociais que, embora possam trazer certo desgaste físico e mental, sua observância é capaz de criar um mundo agradável e prático ao nosso redor, de modo a preservar-nos a intimidade e poupar-nos de ter que criar constantemente maneiras de relacionamento, bastando seguir alguns protocolos comportamentais. Por outro lado, dominar as artimanhas da prática social pode promovê-lo aos mais altos estamentos da sociedade, sem que, para isso, seja necessário possuir algum talento especial, sendo suficiente o pleno domínio dos padrões de comportamento, os quais o ajudarão a abrir brechas no denso emaranhado de interesses conflitantes.
Do mesmo modo, devemos submeter-nos a certos usos e modas correntes na sociedade se realmente queremos participar nela como uma pessoa civilizada, e boa parte das regras começam pelas vestimentas, pois lidam diretamente com a arte de esconder e aparentar. Porém, como nem sempre as vestimentas foram desenvolvidas para serem práticas, faz-se necessário aprender alguns truques que pouparão sacrifícios. A questão a ser abordada neste capítulo é: espartilhos. Quantos e quantos de nós não sacrificamos horas e horas de nossa manhã apenas para ter sua caixa torácica prensada em espartilhos, cujos elásticos estão tão tensos que nem as leis de Newton logram explicar sua efêmera estabilidade?... Apesar do grande dispêndio de energia, são capazes de manter a massa extravagante em ordem, surrupiando, ao menos temporariamente, alguns quilos dos olhos alheios, de modo que são indispensáveis para uma boa apresentação em sociedade. Acontece, todavia, que o esforço em vesti-los é de tal magnitude e exaustão que se chega a duvidar se realmente seu uso vale a pena, desejando-se intensamente que a moda passe ou que ao menos alguém encontre uma solução que alivie o encargo. Pois a dificuldade em vesti-los chegou a tal monta que o seu uso começa a atrapalhar outros hábitos igualmente importantes, resultando em uma perda que põe sua observância em franca desvantagem. Mas há os que digam: "E daí? Que me importa se eu gasto duas horas com espartilhos... O importante é que eu estou bonita e blá blá blá". Insolente, você devia ser afogado na fonte pública. Essas duas horas deveriam estar sendo gastas lendo Thackeray, e não espremendo-se ofegante na frente do espelho. Nada mais deplorável do que uma esposa iletrada, cuja cabeça é tão oca que o marido tem que atravessar um salão enorme ladeado com os bustos de todos os imperadores de Roma para chegar até a sua mulher. É exatamente o que acontece com os espartilhos, cujo prejuízo de tempo compromete outras atividades mais frutíferas e úteis no meio social como a leitura, haja vista o tempo que se leva para vesti-los, tempo este que poderia ser bem melhor aproveitado.
E o que fazer para continuar usando-os sem que isso comprometa tempo e força física? Muitas mulheres tentaram suprimir essa penosa rotina dormindo com os espartilhos, de modo que, quando acordassem, não precisariam chamar Beth, Liza e Mary. O problema, porém, é que pela manhã elas simplesmente não acordavam mais. Muitas foram as que morreram durante a noite, sufocadas debaixo dos lençóis, levando ao túmulo horríveis caretas. Essa não é, certamente, a solução. Mas o momento da rendição chegou. Após muitas experiências e catástrofes científicas, encontrei o mecanismo ideal, que não só eliminará tempo e esforço, como também dor. É, contudo, muito simples, e pode ser realizado por qualquer um, não exigindo grandes custos ou inteligência. Você precisará:
Do mesmo modo, devemos submeter-nos a certos usos e modas correntes na sociedade se realmente queremos participar nela como uma pessoa civilizada, e boa parte das regras começam pelas vestimentas, pois lidam diretamente com a arte de esconder e aparentar. Porém, como nem sempre as vestimentas foram desenvolvidas para serem práticas, faz-se necessário aprender alguns truques que pouparão sacrifícios. A questão a ser abordada neste capítulo é: espartilhos. Quantos e quantos de nós não sacrificamos horas e horas de nossa manhã apenas para ter sua caixa torácica prensada em espartilhos, cujos elásticos estão tão tensos que nem as leis de Newton logram explicar sua efêmera estabilidade?... Apesar do grande dispêndio de energia, são capazes de manter a massa extravagante em ordem, surrupiando, ao menos temporariamente, alguns quilos dos olhos alheios, de modo que são indispensáveis para uma boa apresentação em sociedade. Acontece, todavia, que o esforço em vesti-los é de tal magnitude e exaustão que se chega a duvidar se realmente seu uso vale a pena, desejando-se intensamente que a moda passe ou que ao menos alguém encontre uma solução que alivie o encargo. Pois a dificuldade em vesti-los chegou a tal monta que o seu uso começa a atrapalhar outros hábitos igualmente importantes, resultando em uma perda que põe sua observância em franca desvantagem. Mas há os que digam: "E daí? Que me importa se eu gasto duas horas com espartilhos... O importante é que eu estou bonita e blá blá blá". Insolente, você devia ser afogado na fonte pública. Essas duas horas deveriam estar sendo gastas lendo Thackeray, e não espremendo-se ofegante na frente do espelho. Nada mais deplorável do que uma esposa iletrada, cuja cabeça é tão oca que o marido tem que atravessar um salão enorme ladeado com os bustos de todos os imperadores de Roma para chegar até a sua mulher. É exatamente o que acontece com os espartilhos, cujo prejuízo de tempo compromete outras atividades mais frutíferas e úteis no meio social como a leitura, haja vista o tempo que se leva para vesti-los, tempo este que poderia ser bem melhor aproveitado.
E o que fazer para continuar usando-os sem que isso comprometa tempo e força física? Muitas mulheres tentaram suprimir essa penosa rotina dormindo com os espartilhos, de modo que, quando acordassem, não precisariam chamar Beth, Liza e Mary. O problema, porém, é que pela manhã elas simplesmente não acordavam mais. Muitas foram as que morreram durante a noite, sufocadas debaixo dos lençóis, levando ao túmulo horríveis caretas. Essa não é, certamente, a solução. Mas o momento da rendição chegou. Após muitas experiências e catástrofes científicas, encontrei o mecanismo ideal, que não só eliminará tempo e esforço, como também dor. É, contudo, muito simples, e pode ser realizado por qualquer um, não exigindo grandes custos ou inteligência. Você precisará:
- um espartilho (dã);
- 2 pregos
- 2 ímãs;
- cola.
Imagino que não será difícil obter esses objetos. Acaso tenha dificuldade, repita essas palavras (mas para a sua empregada, e não para as paredes - não vá dar uma de tonta): "Beth, vá até a caixa de ferramentas de meu marido e arranje-me pregos, cola e ímãs". Em um passe de mágica, estarão devidamente em cima de sua cama. Em seguida, estique o seu espartilho de maneira que fique bem amarrado entre o armário e a penteadeira. Pregue as extremidades em ditos móveis. Feito isso, e certificando-se de que o espartilho encontra-se bem esticado, cole (usando a cola) os ímãs nas pontas do espartilho. Imprima seu corpo com os braços levantados contra o espartilho, de modo a fazer um brando "v". Chame Liza e Mary. Liza e Mary deverão despregar os pregos ao mesmo tempo. Essa regra deverá ser cuidadosamente observada pois, caso contrário, os acidentes poderão ser drásticos. Retirados os pregos, as extremidades do espartilho serão impelidas uma em direção a outra, atraídas pelo ímã e impulsionadas pela tensão física, de forma a envolver o seu corpo, deixando seu tórax firmemente preso e comprimido. Como pode ver, tal sistema não leva mais do que alguns minutos: sem dor, sem esforço, sem delongas. E agora você pode gastar a manhã inteira lendo Thackeray, ou qualquer outra coisa que preste, e as suas criadas, claro, poderão dedicar-se a fazer uma deliciosa torta de amora. No final, todos saem ganhando.
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