segunda-feira, 9 de maio de 2011

Desertor porque desertor

Algumas situações me pegam pelo braço com a força de quem quer me ver famoso, fazendo sucesso como um artista de filme americano. Há outras, porém, que igualmente me pegam pelo braço. Sim, mas é para arrastar-me ao armário de limpeza, confundindo o meu lindo terno amarelo com pregas que o meu alfaiate levou semanas fazendo com o uniforme de algum agente da faxina; ou simplesmente porque eu estava parecendo um esfregão. Essa coisa de vestir peruca com tiras de pano retangulares e andar como se estivesse com as juntas das pernas imobilizadas; não funciona, como empiricamente comprovei.

Eu não sirvo para o papel de quem distribui o bolo. Eu nasci para comentar mal do bolo e fazer beicinho com o copo, para ornar a samambaia com os meus braços e jogar-me no chão aos berros: "Derrubaram suco na toalha! E molho também!". Meu coração se fatia quando é obrigado a dar sem amor verdadeiro. Eu digo para ele: "Coração, não se estrangule, não se mate". Mas ele está muito além de mim, e inevitavelmente se suicida para o escândalo dos demais órgãos vitais.

Quando me pediram para que eu distribuísse os copinhos de refrigerante tive vontade de ser a Shadowcat e ir-me lentamente afundando pelo chão até o térreo. Mas, como a gente é gente, e como tal nos sujeitamos a leis físicas e morais que não controlamos, tive de aceitar o encargo e comecei a distribuir. Após o quarto copinho, já estava com vontade de entorná-lo no conviva. Sinceramente, o refrigerante estava ali, sem zona de proibição ou de segurança, sem alarmes e atiradores de elite. Quem quisesse que atingisse a autonomia de pegar. Saí de fininho e não voltei, para longe desses seres prestativos e nocivos ao meu espírito.

Por quê? Porque o Murilo é um moço excelente que descobriu muito cedo que existe o nosso mundo e esse mundinho aí no qual vocês vivem. E lutou bastante para conseguir passar para o lado de cá. E passou. Porque o Murilo não é moço de ficar distribuindo bolinho, copinho de refrigerante... Nasci para ser uma ponte, um rio e só, enrolado em zibelina e fazendo barquinhos de dinheiro. Quanto ao resto, que se limite a  pagar o meu táxi, ou, se preferir, a minha passagem de ônibus, que não sou assim tão ruim que não consiga sustentar ares de paciência e benignidade.

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