segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Hauptstadt

Eu tinha chegado de madrugada no hotel, e a porta encontrava-se fechada. Não havia ninguém na recepção, exceto um rapaz, visivelmente um hóspede ou um pretendente a, sentado num dos sofás, o qual, obviamente, não poderia abrir-me a porta. Não me preocupei, pois bastava tocar a campainha e esperar que viesse algum funcionário. Acontece que o rapaz, desde atrás da porta de vidro, olhava-me insistentemente, carrancudo, severo, e até me senti intimidado pensando ser uma avaliação negativa de meu aspecto ou comportamento. Percebi, porém, pelo seu meio termo entre estar sentado e estar de pé, que estava apenas sentindo-se obrigado a ajudar-me, e o que parecia ser um olhar de reproche era na verdade preocupação. Levantou-se, pois, e, fazendo um gesto com a mão para que eu aguardasse, foi chamar alguém do hotel. Veja bem, isso era totalmente desnecessário.

Instantes depois, voltou e sentou-se no mesmo sofá. O funcionário veio logo em seguida e abriu-me a porta.  Mesmo que sua ação tivesse sido de um zelo dispensável, estava eu, obviamente, obrigado a agradecê-lo, e, ao entrar e passar por ele, disse-lhe "obrigado", pelo qual recebi em troca um leve, um mínimo, um imperceptível aceno de cabeça. Foi então que vi, reconheci, tal qual olhasse em um espelho, não somente a minha pessoa, mas a de tantas outras. Aquela carranca, a cabeça inclinada para baixo, o olhar duro e sério ressaltado atrás das sobrancelhas, o expressar lacônico, tudo isso que eu já havia visto uma centena de vezes, mas que até então não havia me dado conta de sua força estética.

E senti-me agradecido por ter encontrado meu igual, em saber-me não mais um ser isolado, desvinculado e flutuante. E, evidentemente, não teria me sentido tão agradecido se não fosse pelo fato de eu ter achado sua expressão e seu gesto belíssimos. Por haver se obrigado tão desnecessariamente, por haver se incomodado por alguém sem - ah glória - atrever-se a exigir um agradecimento. Como deve ser, como deve ser! Ele me ensinou o amor próprio, uma rota que eu posso seguir e atingir o ápice da humanidade sem que para tanto eu necessite descartar coisas que para mim são tão fundamentais, tão... minhas. Uma rota por onde eu possa passar com minha comitiva sem que para isso eu precise humilhar-me e ridicularizar-me abrindo mão de coisas que são valiosas para mim.

Eu descobri a minha capital. A capital de pessoas que não pedem seu abraço sincero e gostoso, mas apenas que continue seus afazeres, pois nada demais aconteceu. E sobre o mapa traço o caminho que me conduzirá ao ponto máximo a que eu sempre estive inclinado. E que nenhum biltre venha dizer-me o que há de certo ou errado, pois eles não sabem apreciar, não sabem compreender o apelo de perfeição que carrega cada coisa em sua essência. E por isso eles destroem, anulam, subjugam culturas inteiras, inconscientes da realização intrínseca que carregam desde há muito tempo.

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